19 de abril de 2020

a escrita de uma nova carta levou-me a um texto cheio de reminiscências que se tornou muito maior do que pensei e que começa a revelar estar repleto de ramificações para múltiplas histórias. muito embora tema não conseguir urdi-las a todas, enquanto termino blocos de texto, o vocabulário começa a surgir com facilidade como um rio que jorra da montanha e vou enchendo o documento de anotações para que a memória mais tarde não me falhe sabendo, contudo, que não tenho garantias nem de me recordar dos textos (completos em segundos na minha cabeça) a que aquelas anotações apressadas me deverão conduzir nem de, quando a elas regressar, ainda fazerem sentido. depois de ter escrito, sinto-me tão realizada como se tivesse cumprido uma vida de tarefas absolutamente necessárias para a melhoria do mundo. não tenho ilusões: fui agora mesmo reler esse texto e estou em luta com ele, com as coisas pouco claras, contraditórias e dúbias que escrevi. ainda assim, sinto-me bafejada pela sorte por, ao decidir tirar tempo para escrever, ter sido possível retirar-me por momentos da pandemia, das dificuldades e da consciência por vezes atrofiante que tenho de mim própria. não há nada que dê mais sentido à vida do que podermos esquecer-nos de nós próprios.