24 de janeiro de 2020

INTERVIEWER: Mr. Faulkner, you were saying a while ago that you don't like interviews.

WILLIAM FAULKNER: The reason I don't like interviews is that I seem to react violently to personal questions. If the questions are about the work, I try to answer them. When they are about me, I may answer or I may not, but even if I do, if the same question is asked tomorrow, the answer may be different.

21 de janeiro de 2020

O olhar vago dos velhos nas fotografias perturba-me e, ao mesmo tempo, alegra-me. Para onde olham? O que veem? Parecem ausentes e, contudo, correspondem ao momento. Para além do desajuste às exigências da vida, essa vagueza — imagino eu com ingenuidade — é a possibilidade de encontrar outra vida, outra história, como as que uma criança encontra nas sombras. Apetece-me defendê-los dos bolos de aniversário cheios de velas, da violência das perguntas que se repetem, sempre as mesmas, da Cristina Ferreira e dos dias cinzentos, sem ninguém. Mas talvez eles não precisem de defesa. Talvez as velas, as perguntas e a Cristina Ferreira preencham uma cavidade que entretanto se mostrou oca.

18 de janeiro de 2020

O luto sobrepõe-se à melancolia.

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Há que dirigir-se ao outro fora da subordinação de qualquer eficácia.

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É necessário falar a sua própria linguagem. Isto é um problema político.

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São os murmúrios do mundo que nos sustentam.

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Nunca se procura o que se encontra.

11 de janeiro de 2020

(...) 14 de janeiro

todo o santo dia bateram à porta. não abri, não me apetece ver pessoas, ninguém.
escrevi muito, de tarde e pela noite dentro.
curiosamente, hoje, ouve-se o mar como se estivesse dentro de casa. o vento deve estar de feição. a ressonância das vagas contra os rochedos sobressalta-me.
desconfio que se disser mar em voz alta, o mar entra pela janela.
sou um homem privilegiado, ouço o mar ao entardecer. que mais posso desejar?
e no entanto, não estou alegre nem apaixonado. nem me parece que esteja feliz.
escrevo com um único fim: salvar o dia. (...).

Al Berto, O Medo.
Teria 72 anos hoje.
A doença transforma-nos ao ponto de nos tornarmos na antítese de nós próprios. Sempre que estou doente, lembro-me do Oscar Wilde que dizia "Meu Deus, livra-me das dores físicas que das morais trato eu".  E, mais vezes do que gostaria de admitir, nos momentos especialmente complicados rezo fervorosamente, como se dali a minutos chegasse a morte. Comprometi-me muitas vezes com o desalento de quem não tem recursos suficientes para a cura e percebi que cada doença tem o seu delírio próprio, a sua narrativa, sempre acompanhada pelo isolamento, mesmo que estejamos no Hospital mais agitado. Como criadoras de identidade, as narrativas moldam a nossa perspetiva sobre o mundo. Penso que o âmbito do que consideramos ser uma alucinação é definido por este movimento que passa dos vapores do delírio, de onde tantas vezes emergem as epifanias, à ímpia clareza. Quem somos quando a doença passa? Tabula rasa, constatamos que o que julgávamos adquirido — seja nos domínios do conhecimento ou da ação —, esmoreceu, se dissipou ou se extinguiu. Estamos agora mais frágeis do que nunca e o mundo exterior impressiona-nos como se tivéssemos acabado de nascer.