13 de junho de 2017

festas, segredos, ameaças, um júbilo desconcertante, alimentam os meus sonhos. acordar deles é ao mesmo tempo um alívio e um esforço, e nunca sei o que é real, se a vigília se aquilo com que sonhei. seja como for, num caso como no outro, estou sempre à procura de algo que não encontro e, assim, não é tão significativa a diferença que os separa: é o que obscura a divisão que me intriga, como se nela houvesse um terceiro mundo em que ambos se juntam, que porventura fosse o mais real de todos. dizem que quando pintava, Salvador Dalí se deixava adormecer em frente à tela com uma colher na mão pousada no joelho. por baixo colocava um balde de água e, quando a colher caía na água, pintava o que tinha visto durante a impercetível transição entre o estado desperto e o sono. poderíamos pensar que coisas como esta talvez só tivessem lugar no âmbito do surrealismo, que não é feito de sentidos imediatos e privilegia as intrusões na psique, mas também cientistas e filósofos têm trazido revelações estruturantes dos seus sonhos. tudo se passa como se de facto a lucidez não pudesse passar-se deles. e contudo, o que sabemos deles? desde logo, a consciência — de nós próprios mas também do ambiente em que nos encontramos — parece ser impreterivelmente mais aguda, mais preenchida. se permanecem enigmáticos, mesmo quando pensamos ter aprendido a sua língua, talvez seja porque a imaginação não se encerra na descrição da vida ou da morte, que define o nosso tempo e o nosso espaço. a relação ambígua que mantemos com eles demonstra que somos meros rumores das nossas ficções.