6 de maio de 2017

quero ir numa exploração à Mongólia, caminhar em silêncio contra mil ventos, apagando aos poucos a lembrança de onde vim e fixar o horizonte como uma eternidade sem destino. lá, serei como o cavalo, sábio e forte, encostarei a cara à terra, cuja modulação erótica e apocalíptica me atacará ferozmente, emocionando-me como uma ausência. a alucinação dos sons bate-me no corpo e o seu ritmo, árido e metafísico, leva-me ao fundo do tempo onde há carência de tudo menos da morte. caminharei com um amigo em silêncio, comerei com ele, e, juntos, inventaremos a alegria que ninguém toca por ser uma perigosa proliferação de universos. quando voltar, deixarei a mão direita no meu lugar, com a sua vocação para viver entre a germinação das formas. não procurarei ninguém e ninguém me procurará. sento-me à varanda da minha casa a apreciar a nespereira do jardim diante carregada de fruta que cairá antes de ser colhida, e tudo — sol, céu, nuvem, chuva, calor e frio —, será como uma anunciação.