1 de agosto de 2019
Gostava de ser uma leitora pouco ambiciosa. Leria de seguida coleções completas de uma única editora, estudaria um filósofo anos a fio, dedicar-me-ia a um período da História, um poeta, um romancista, tudo com tempo e sem sofreguidão, sem pensar no livro seguinte ou no livro que me aparecesse diante dos olhos, me passasse pelas mãos, me encontrasse. Mas é inútil. A prateleira dos livros que tenho para ler ocupa agora um móvel inteiro e isso inclui alguns livros que me emprestaram. Também me esqueço dos livros que li. Não sinto angústia, mas tenho pena. Significa que um livro lido volta, após algum tempo, a ser um livro que posso reler sem me lembrar de nada, ou seja, volta a ser acrescentado à pilha dos livros que tenho em casa para ler. Também me esqueço dos filmes, mas não das fotografias nem das músicas e não tenho a mínima pista para o explicar. Os nomes, as palavras, foram sempre mais difíceis para mim: primeiro tardam em aparecer e depois desaparecem sem deixar rasto. Começo sempre vários livros, mas, por vezes, acontece entregar-me apenas a um, sem deixar que nada nos interrompa, que nada se interfira entre mim e a leitura. Eu e o livro desaparecemos, somos um universo constante preenchido por uma audição tátil, saborosa, e quanto mais o tempo passa, mais quero estar a sós com o meu livro. Única exceção, o tempo da escrita. Quando a escrita se torna exigente não leio nada e penso sempre que nunca mais quero ler.