ocultar o rosto. barbas, maquilhagem, tatuagens, o cabelo que se força a cobrir a testa, fotografias com óculos e orelhas de animais virtuais, e os recursos ao photoshop que, entre olhos aumentados e defeitos escondidos, aumentam e se diversificam.
o que é o rosto? em Lévinas, o seu grande filósofo, o rosto não deve ser entendido no sentido próprio. ele excede qualquer descrição possível, seja a cor dos olhos, a forma do nariz, o desenho dos lábios, o seu eixo, como qualquer outra característica ou atributo. Lévinas descreve o rosto como uma miséria, uma vulnerabilidade e uma indigência que, em si, sem palavras explícitas, imploram ao sujeito uma resposta, exigindo-lhe apoio e ajuda. o acesso ao rosto é, pois, imediatamente ético: "Le visage s’impose à moi sans que je puisse cesser d’être responsable de sa misère. La conscience perd sa première place" (Totalité et infini, 1961). nele, o olhar é conhecimento, perceção. está sempre a nu, oferecido, exposto, sem defesa. a relação social com outrem impede a sua objetivação, a sua descrição. e é ambivalente: na sua nudez, a primeira palavra, que não é dita mas cujo significado é expresso, é «não matarás». mas a nudez do rosto traz consigo igualmente a mensagem inversa, a da tentação do homicídio. enfim, o rosto «fala», reclama que lhe respondamos e que respondamos por ele. a sua aparição é um mandamento moral, uma ordem.
tenho prazer em contemplar rostos completamente nus, sem maquilhagem ou adereços, pois são uma potência ativa reveladora de intimidade. tão mais perto se encontram da beleza mais intacta quanto mais perigosamente se aproximam da nudez mais crua, mais pobre.