13 de agosto de 2024
10 de agosto de 2024
24 de julho de 2024
Amedeo recebe uma carta de uma antiga amante, Simone Thiroux, estudante de medicina, que o informa do seu regresso ao Canadá e de ter dado à luz um filho, de que ele é pai. Amedeo nunca reconhece a criança. Diz que encontrou o seu grande e verdadeiro amor em Jeanne Hébuterne, uma pintora em ascensão com quem se muda para a Provença na primavera, depois de ela engravidar. A 29 de novembro de 1918, Jeanne dá à luz uma menina e regista-a sozinha: "Giovanna Hébuterne, pai desconhecido." No final de junho de 1919, descobre-se novamente grávida e diz a Amedeo, que lhe responde: "Não temos sorte!" É rejeitada pela família por querer estar com ele. Um ano depois, é o frio glacial do início de janeiro. Amedeo regressou de uma longa noite de absinto e drogas. Estão trancados no estúdio, escondidos, sem nenhuma visita durante uma semana. Amedeo delira de febre e ressaca e Jeanne desenha-se convulsivamente a si própria. Não têm carvão nem água. Quase não têm comida, comem sardinhas em lata. Grávida de nove meses, Jeanne desce até ao pátio nas traseiras do estúdio e carrega água do poço para casa enquanto Amedeo delira ou dorme. Quando Manuel aparece e vê a cena, envia Amedeo para ser internado e leva Jeanne para o Hotel de Nice, no boulevard Montparnasse. Amedeo morre sete dias depois no hospital. Informado da morte do seu irmão, Giuseppe telegrafa a Moïse: "Enterra-o como um príncipe". No dia seguinte, Manuel dá a notícia a Jeanne e leva-a ao hospital para ver Amedeo. Jeanne aproxima-se e olha para ele durante muito tempo. Depois, corta uma mecha de cabelo, coloca-o sobre o peito de Amedeo e sai sem dizer uma palavra. Prestes a entrar em trabalho de parto, os pais consentem em recebê-la, e Jeanne regressa ao bairro do Panthéon, onde nasceu. Fica a dormir no seu quarto, no quinto andar, vigiada pelo irmão André. Às três da manhã, com o irmão adormecido à beira da cama, abre a janela voltada para o pátio da rua Amyot, volta-se de costas e atira-se. Os corpos de Jeanne e do bebé são recolhidos por um operário que os transporta de volta ao quarto ao quinto andar, onde André lhe fecha a porta. Com a ajuda de um carrinho, o operário leva-os para o estúdio, onde a zeladora diz que Jeanne não é uma inquilina oficial e se recusa a recebê-los. O operário caminha sem rumo pela cidade. Encontra a polícia, que lhe ordena que leve os corpos de volta ao estúdio e mostra à zeladora uma ordem para os receber. Jeanne e o bebé ficam aí abandonados durante toda a manhã. Uma amiga de Jeanne da Academia Colarossi, Chantal Quenneville, e Jeanne Léger, vão até ao ateliê. Léger vai buscar uma enfermeira para os limpar e vestir. Os pais de Jeanne decidem enterrá-los no cemitério de Bagneux. A cerimónia é no dia seguinte, às escondidas e sem ninguém, o mesmo dia em que Amedeo vai a enterrar no Père Lachaise numa cerimónia que se transforma num estrondoso acontecimento público com centenas de amigos, amantes e admiradores. Giovanna, a filha do casal, então com quatorze meses, é levada para Livorno, a cidade onde Amedeo havia nascido. Educada pela avó Eugénie Garsin-Modigliani, e pela tia, Margherita Modigliani, cresce a ouvir falar sobretudo do seu pai. Nove anos depois, o seu tio convence os pais de Jeanne a juntar os seus restos mortais aos do príncipe de Montparnasse.
18 de julho de 2024
11 de julho de 2024
6 de julho de 2024
29 de junho de 2024
27 de junho de 2024
24 de junho de 2024
13 de junho de 2024
30 de maio de 2024
22 de maio de 2024
11 de abril de 2024
Gilles Deleuze, «Les intercesseurs», Pourparlers 1972-1990.
Num exercício de correspondência notavelmente rigoroso entre os materiais utilizados e a matéria da obra, em Mirror Drumming Biscainho questiona a noção de limite. Limites sociais e humanos, limites éticos e tecnológicos, limites que dizem respeito a um todo e não apenas a uma parte. Nas paredes da Appleton estão fotografias da série Landscapes for a Free Field cujo reflexo treme, vibra e se distorce na superfície de instrumentos de percussão onde a pele foi trocada por uma película de espelho de alta definição. As vibrações são provocadas por um som, curtas frases de percussão previamente gravadas, tocadas por Marco Franco, são intercaladas por períodos aleatórios de silêncio. Nestas fotografias estão pormenores de interiores de algumas das câmaras anecóicas mais avançadas que existem atualmente, fabricadas na Califórnia, que Biscainho visitou e fotografou em 2014. Uma câmara anecóica, ou seja, uma câmara privada de ecos, é uma sala em cujo interior o reflexo de ondas sonoras e de ondas eletromagnéticas é anulado. Aqui, qualquer interferência é absorvida no embate com as paredes forradas com pirâmides de espuma e, assim, este espaço interior pode ser definido como um campo livre. Uma câmara anecóica é o simulacro de um espaço aberto com uma dimensão infinita. Ao lado das imagens onde vemos enquadramentos destas anecóicas, Biscainho instala vários painéis pintados com pigmentos pretos e grafeno que bloqueiam as radiofrequências e a emissão de ondas eletromagnéticas no espaço (proteção RF). De que está o artista a proteger-nos?
A exposição continua com This silence for a new society... (that makes me to go back in time): uma mandíbula de cobre parcialmente mergulhada em leite em cima de um plinto construído pelo artista. Tudo nesta peça, de uma beleza alucinante, me interroga. Sou levada a pensar sobre a caracterização deste silêncio. A manutenção do mundo — das relações, no sentido tanto de cuidado como de conservação — é feita através de um escrupuloso uso do silêncio. O que é silenciado tem poder na exata medida em que é formador de uma identidade e define a elasticidade de um vínculo. A linguagem mostra-se particularmente inadequada e ineficaz para dar conta daquilo que se desenvolve na sensibilidade individual e o silêncio acaba por ser a possibilidade que temos de fazer face à nossa incompletude e contradição constitutiva. São categorias como estas — a fissura, a imperfeição, o inconveniente — que nos situam na relação com os outros. Há coisas que, uma vez ditas, arruinariam uma relação. São também essas que nos permitem verificar as suas fundações. O silêncio é um processo interativo que responde ao comportamento de outros seres humanos. Como fizeram as pessoas escravizadas, pode ser a única forma de resposta e resistência ao opressor.
Todo o campo da atividade humana é investido pela linguagem. "Não há sociedade sem linguagem, tal como não há sociedade sem comunicação." (1) Uma condição: a fala é, na definição de Saussure, «um ato individual de vontade e inteligência». (2) A existência de discurso implica a participação ativa do sujeito, ou seja, o discurso é sempre intencional. É esta a razão principal para que a linguagem seja o terreno da psicanálise. Dominar a linguagem é dominar o homem e as classes dominantes souberam explorar a arte da oratória para consolidar a sua supremacia. Da mesma maneira, as classes subjugadas desenvolvem um sentido de união e de resistência através da linguagem que aperfeiçoam, afinando sinais em que é possível reconhecer a sua insubmissão ou a sua rendição. O modo de falar não é, por conseguinte, indiferente ao conteúdo da fala, pelo contrário, o modo de falar estrutura o conteúdo ideológico.
Mas ter uma ideia não é comunicar.
O homem moderno está imerso em signos, gestos e imagens. Mas as ideias não são necessariamente tornadas visíveis. O silêncio de que se fala em Mirror Drumming é uma relação entre o momento atual e o desenvolvimento de certos dispositivos tecnológicos. Com um ensaio clínico atualmente a aceitar participantes, desenvolvido por Elon Musk, o Neuralink (3) será instalado no cérebro e permitirá influenciar o seu funcionamento, nomeadamente emocional (induzir tristeza, prazer, etc.). A hipótese que vem trazer encontra-se na linha daquilo que tem vindo a ser implementado através da manipulação algorítmica e levará a que seja possível ler os pensamentos de um indivíduo sem que este produza som ou externalize qualquer tipo de pensamento. Criado pelo cientista informático Arnav Kapur, o Alter Ego (4) é simplesmente aplicado no queixo e faz a leitura em tempo real das vibrações emitidas pela mandíbula humana inferior quando pensamos em algo, sem verbalizar qualquer som. Trata-se de um dispositivo de leitura do pensamento através da leitura de micro vibrações traduzidas por algoritmo para a nossa linguagem escrita convencional.
O quadrado de cobre suspenso ao lado da mandíbula — um material altamente condutor que permite captar e transmitir sinais e energia —, é uma forma de ligação à terra frequentemente usada como dispositivo de segurança de descargas elétricas. Neste caso, ligado à mandíbula mergulhada na cama de leite, também ela feita em cobre, serve de antena que captura a atividade eletromagnética do cosmos (background noise). O quadrado de cobre não está aqui porque o artista pretenda traduzir o cosmos. Nas palavras do próprio, "o cosmos é esmagador". É antes esse não significado que é adicionado à tecnologia das vibrações fisiológicas e íntimas. No fundo, esta antena adaptada vai captar e transmitir ruído sobre a mandíbula em cobre, camuflando os sinais neurais periféricos que o nosso pensamento emite ao osso do maxilar, tornando assim impossível a sua leitura pelo algoritmo. Aquilo em que estamos a pensar deixa de poder ser lido. This silence for a new society... (that makes me to go back in time) é um objeto de intervenção política. João Biscainho criou um instrumento de resistência.
Se a subordinação ao momento é o Ás de trunfo da ética, a sua superação é o do poder. É com os interesses mais elementares da vida quotidiana que o poder joga e oportunamente instaura os seus mecanismos de controlo. Quem sabe domina. Quem acredita é dominado. E é também aqui que surge a fronteira: entre silêncio e linguagem, entre ato e potência, reside esta zona fechada, impenetrável à observação, à reflexão ou à teoria, pois a fronteira não é nem silêncio nem linguagem, nem consciente nem inconsciente. Que atos estão representados em Mirror Drumming? Os atos primitivos, que indicam a presença de certos ritos. Comunicar. Celebrar. A fome. É nesta relação entre a ideia e o ato invisível que a exprime, que se produz uma unidade e não uma distinção, uma simultaneidade de causa e efeito e não uma sucessão de ações e reações. É esta ausência da História que marca o posicionamento crítico dos trabalhos do artista.
(2) Ferdinand de Saussure, Cours de linguistique générale, Paris: Payot, 1949, 30–1.
(3) Neuralink: https://neuralink.com/
(4) Alter Ego: https://www.media.mit.edu/projects/alterego/overview/