Como tudo é vão!
Arrasa uma cidade,
ergue-te do pó dessa cidade,
assume um cargo
e finge,
para evitares expor-te.
Cumpre as tuas promessas
diante de um espelho cego no ar,
diante de uma porta fechada ao vento.
Virgens são os caminhos nas escarpas do céu.
Ingeborg Bachmann, O Tempo Aprazado.
30 de junho de 2016
27 de junho de 2016
um casal de turistas de banho tomado e perfumados, ela com bijuteria cara e maquilhada, ele de fato azul, gravata e lenço, ambos loiros, passa ao lado de dois caixotes de lixo cheios rodeados de um monte de sacos de lixo empilhados num bairro lisboeta. a acreditar na sorte e ao que parece, não os viram. sobem a colina sorrindo um ao outro, alheados da cidade onde passeiam, de visita. passando ao seu lado, desvio o olhar, e é isso o que de mais fecundo e decisivo tenho, precisamente agora.
é certamente admirável. previ o fracasso desde sempre, mas não me atrevi a perguntar pela estranheza que ocorre como um gemido fruto de uma epidemia. sou culpada. tenho uma língua.
é certamente admirável. previ o fracasso desde sempre, mas não me atrevi a perguntar pela estranheza que ocorre como um gemido fruto de uma epidemia. sou culpada. tenho uma língua.
24 de junho de 2016
mal o disse, bateu nas coxas, no entanto com uma eficácia duvidosa, resultado de uma dieta de emagrecimento. face a face, lúcidos como um diabo, observavam a mutação daquilo que não sabiam e nenhuma explicação parecia suficiente. eram agora reféns do momento. qualquer palavra teria sido alvo de cinismo e, por isso, o silêncio prevaleceu, ainda que nele houvesse um efeito surpresa: viram-se envelhecer com uma indecência indigna, de repente.
23 de junho de 2016
22 de junho de 2016
fico imóvel, como um animal alegre, à entrada do frigorífico, porque a matéria adere à matéria, e me vejo na abertura branca, sem mim, não como uma ausência mas sim como um milagre, sem felicidade ou infelicidade, como um dom, ou um delírio, por exemplo, através do qual seria possível escorregar se os olhos não ficassem aterrados com o vácuo.
20 de junho de 2016
acossada por nunca ter entrado nas perguntas
a constância chegou
numa palavra estrangeira
impronunciável
que ninguém aceita
é intolerável cantar alto
entre o sopro monótono das imagens
como uma montanha inacessível
e transparente
dissipo-me
a quem atribuir a culpa
do pudor e do escrúpulo
se nada há de mais arguto
animal acossado numa força
que irradia do que já não vive
vigio o jogo impassível da ordem
a constância chegou
numa palavra estrangeira
impronunciável
que ninguém aceita
é intolerável cantar alto
entre o sopro monótono das imagens
como uma montanha inacessível
e transparente
dissipo-me
a quem atribuir a culpa
do pudor e do escrúpulo
se nada há de mais arguto
animal acossado numa força
que irradia do que já não vive
vigio o jogo impassível da ordem
esta semelhança esculpida
na substância
massiva
da beleza feminina
promete a realização
de elevada
fantasia
material de pureza
se quiserem
ligeiramente desconfortável
como uma série
de acontecimentos
ligados
pela improbabilidade
e ainda assim
inflamáveis
como um génio
ingénuo
enfim
uma banalidade
o último dinossauro
a invenção do fogo
a divisão do átomo
uma paródia
hilariante
na substância
massiva
da beleza feminina
promete a realização
de elevada
fantasia
material de pureza
se quiserem
ligeiramente desconfortável
como uma série
de acontecimentos
ligados
pela improbabilidade
e ainda assim
inflamáveis
como um génio
ingénuo
enfim
uma banalidade
o último dinossauro
a invenção do fogo
a divisão do átomo
uma paródia
hilariante
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