"Noto que as pessoas não falam de dois ou três aspetos em que ele foi fundamental para a democracia portuguesa e que talvez passam um pouco ao lado, talvez porque as pessoas sejam mais novas, não tenham tanta memória, não sei. (...) Ele e o dr. Sá Carneiro, e o Magalhães Mota, fizeram uma coisa fundamental para a democracia que foi criar um partido político democrático enraizado numa visão da democracia liberal para enquadrar a direita dos altos funcionários públicos, a direita da sociedade civil, que viveu sempre bem, confortável, com o fascismo, e que eles conseguiram enquadrar num grande partido democrático sem dar espaço a derivas mais... radicais... no sentido da direita radical... que podiam ser nefastas para a democracia."
ouvi este testemunho da jornalista Teresa de Sousa, esta manhã no podcast P24 do jornal Público. foi a primeira vez que ouvi alguém dizer isto preto no branco e com as pintas todas nos is. algo que para mim — que tenho uma consciência política aprendida a pulso através do embate das minhas circunstâncias pessoais com a realidade, leituras, e a observar o mundo, pois não tive uma educação política nem em casa nem na escola, onde mesmo a nível da disciplina de História não se passava de falar dos "Descobrimentos" — se tornou evidente apenas com o tempo, e que muita gente continua a querer escamotear, aqui está dito por uma jornalista, porventura com a ingenuidade dessa fé na liberdade que alimenta todos os jornalistas. não se fala porque não dá jeito. não se fala porque esse é um assunto em que nunca se quis tocar, muito menos quem está no PSD. a estranheza de que não conseguia livrar-me perante a unanimidade homogénea de opiniões de todas as pessoas que ouvi falarem de Francisco Pinto Balsemão, e que soa a ocultação, está explicada. porque não há outro elogio para além do culto à liberdade com que ele contagiou, e construiu, o país? dizemos muitas vezes que a supressão da revolução social com a vitória de Franco na guerra civil em Espanha foi fatal para a democracia que hoje aí é possível viver. que termos tido uma revolução em Portugal foi decisivo. nunca sequer se menciona que meramente ter havido prisões e condenações para a arraia miúda da PIDE, mas ampla integração para os dirigentes e cúmplices do regime do Estado Novo foi decisivo para a nossa.
"Haverá que reconhecer que os revolucionários do 25 de Abril, incluindo os milhares de torturados durante a longa noite fascista, foram demasiadamente meigos e tolerantes para com o bando de assassinos da PIDE. Enquanto forças do MFA trataram a PIDE e os Pides, no próprio antro onde tinham sido cometidos tantos crimes, com luvas de veludo, incluindo aquele que mandara atirar sobre a multidão desarmada, que manifestava a sua alegria pelo derrubamento da ditadura fascista. Em momentos de pequenas tensões sociais nas empresas, lá estavam a passear-se agentes da PIDE acompanhados ou a acompanharem patrões e capatazes e bufos mais ou menos conhecidos em atitudes intimidatórias, ameaçando abertamente com o despedimento, a prisão e espancamentos os que insistiam, por exemplo, em reclamar aumento de salários e melhores condições de trabalho."