23 de outubro de 2025



"Noto que as pessoas não falam de dois ou três aspetos em que ele foi fundamental para a democracia portuguesa e que talvez passam um pouco ao lado, talvez porque as pessoas sejam mais novas, não tenham tanta memória, não sei. (...) Ele e o dr. Sá Carneiro, e o Magalhães Mota, fizeram uma coisa fundamental para a democracia que foi criar um partido político democrático enraizado numa visão da democracia liberal para enquadrar a direita dos altos funcionários públicos, a direita da sociedade civil, que viveu sempre bem, confortável, com o fascismo, e que eles conseguiram enquadrar num grande partido democrático sem dar espaço a derivas mais... radicais... no sentido da direita radical... que podiam ser nefastas para a democracia."
 
ouvi este testemunho da jornalista Teresa de Sousa, esta manhã no podcast P24 do jornal Público. foi a primeira vez que ouvi alguém dizer isto preto no branco e com as pintas todas nos is. algo que para mim — que tenho uma consciência política aprendida a pulso através do embate das minhas circunstâncias pessoais com a realidade, leituras, e a observar o mundo, pois não tive uma educação política nem em casa nem na escola, onde mesmo a nível da disciplina de História não se passava de falar dos "Descobrimentos" — se tornou evidente apenas com o tempo, e que muita gente continua a querer escamotear, aqui está dito por uma jornalista, porventura com a ingenuidade dessa fé na liberdade que alimenta todos os jornalistas. não se fala porque não dá jeito. não se fala porque esse é um assunto em que nunca se quis tocar, muito menos quem está no PSD. a estranheza de que não conseguia livrar-me perante a unanimidade homogénea de opiniões de todas as pessoas que ouvi falarem de Francisco Pinto Balsemão, e que soa a ocultação, está explicada. porque não há outro elogio para além do culto à liberdade com que ele contagiou, e construiu, o país? dizemos muitas vezes que a supressão da revolução social com a vitória de Franco na guerra civil em Espanha foi fatal para a democracia que hoje aí é possível viver. que termos tido uma revolução em Portugal foi decisivo. nunca sequer se menciona que meramente ter havido prisões e condenações para a arraia miúda da PIDE, mas ampla integração para os dirigentes e cúmplices do regime do Estado Novo foi decisivo para a nossa.
 
"Haverá que reconhecer que os revolucionários do 25 de Abril, incluindo os milhares de torturados durante a longa noite fascista, foram demasiadamente meigos e tolerantes para com o bando de assassinos da PIDE. Enquanto forças do MFA trataram a PIDE e os Pides, no próprio antro onde tinham sido cometidos tantos crimes, com luvas de veludo, incluindo aquele que mandara atirar sobre a multidão desarmada, que manifestava a sua alegria pelo derrubamento da ditadura fascista. Em momentos de pequenas tensões sociais nas empresas, lá estavam a passear-se agentes da PIDE acompanhados ou a acompanharem patrões e capatazes e bufos mais ou menos conhecidos em atitudes intimidatórias, ameaçando abertamente com o despedimento, a prisão e espancamentos os que insistiam, por exemplo, em reclamar aumento de salários e melhores condições de trabalho."
 

15 de outubro de 2025

"O sonho era maravilhoso, mas o terror era grande; temos de guardar o sonho apesar do terror; porque o sonho mostrou que o sofrimento acaba por atingir o homem saudável, que o fim da vida é triste."

O Gilgamesh
Sonhei que perdia dinheiro.
Sonhei que enlaçava os atacadores.
Sonhei que traziam às minhas mãos favos de mel.
Sonhei que era tempo. 
Sonhei que estava cansada. 
Sonhei que havia perigo.  
Sonhei que não falava.  
Sonhei que os enfrentava.
Sonhei que o sonho era real. 
Sonhei que ia, mas não sabia. 
Sonhei que caminhava sobre a água. 
Sonhei que me ouvia pensar. 
Sonhei que tudo se realizava. 
Sonhei que não conseguia dormir.