29 de novembro de 2019

Não quero dar-me bem com toda a gente. Não gosto de toda a gente. Não sou nem quero ser politicamente correta. Mas também não preciso de ter uma opinião sobre tudo. Há assuntos que não me interessam. Outros há ainda que me interessam sem que sinta necessidade de me manifestar sobre eles. Não tenho uma fotografia para publicar todos os dias no Instagram. Nem todas as semanas nem todos os meses. Não preciso de publicar nas redes sociais os livros que leio, os espetáculos a que assisto, as exposições que visito. Devia haver mais silêncio. São as crianças que dizem tudo o que lhes passa pela cabeça. Escolher não falar é um sinal de emancipação. Se isso custar a admiração de alguém, tanto melhor, será revelador. Gostaria de ter um impacto discreto no mundo, reservado, como um segredo que só se oferece a alguns. Dito isto, a verdade é que tenho — sempre tive — dificuldade com as palavras. Não sou prolixa, sou nefelibata. Prezo a minha solidão e claramente prefiro escrever do que falar. Pressinto a ameaça dos mal entendidos em cada diálogo, como se se tratassem de armadilhas potenciais, outros como verdadeiros flagelos infligidos pela verborreia e pela vaidade, incluindo a minha própria. Além disso, preciso de esvaziar a cabeça mais do que me permito. O prazer da contemplação é das coisas mais preciosas que descobri na vida. Não ter de me explicar ao mundo, nem de me provar, é condição indispensável de uma existência que dispensa o alarde da felicidade.