11 de agosto de 2017

Adiamos as perguntas decisivas, fazendo ininterruptamente perguntas ridículas, inúteis e infames e, quando fazemos as perguntas decisivas, é tarde de mais. Toda a vida vamos adiando as grandes perguntas, até que elas se tornam uma cordilheira de perguntas e nos obscurecem. Mas nessa altura é tarde de mais. Devíamos ter a coragem (face àqueles a quem temos de perguntar, como face a nós próprios) de os atormentar com perguntas, sem consideração nenhuma, implacavelmente, não os poupar não os burlar com a complacência. Ficamos arrependidos de não termos perguntado nada, quando aquele a quem tínhamos de perguntar já não pode ouvir essas perguntas, já está morto. Mas mesmo que tivéssemos feito todas as perguntas, teríamos obtido nem que fosse uma única resposta? Nós não aceitamos a resposta, nenhuma resposta, não podemos fazê-lo, não devemos, assim é a disposição da nossa sensibilidade e o nosso estado de espírito, assim é o nosso ridículo sistema, assim é a nossa existência, o nosso pesadelo. 

Thomas Bernhard, Autobiografia — O Frio.