Adiamos as perguntas decisivas,
fazendo ininterruptamente perguntas ridículas, inúteis e infames e,
quando fazemos as perguntas decisivas, é tarde de mais. Toda a vida
vamos adiando as grandes perguntas, até que elas se tornam uma
cordilheira de perguntas e nos obscurecem. Mas nessa altura é tarde de
mais. Devíamos ter a coragem (face àqueles a quem temos de perguntar,
como face a nós próprios) de os atormentar com perguntas, sem
consideração nenhuma, implacavelmente, não os poupar não os burlar com a
complacência. Ficamos arrependidos de não termos perguntado nada,
quando aquele a quem tínhamos de perguntar já não pode ouvir essas
perguntas, já está morto. Mas mesmo que tivéssemos feito todas as
perguntas, teríamos obtido nem que fosse uma única resposta? Nós não
aceitamos a resposta, nenhuma resposta, não podemos fazê-lo, não
devemos, assim é a disposição da nossa sensibilidade e o nosso estado de
espírito, assim é o nosso ridículo sistema, assim é a nossa existência,
o nosso pesadelo.
Thomas Bernhard, Autobiografia — O Frio.