18 de março de 2016

Proença da Beira, por exemplo, uma cidade a norte de Portugal, com os seus cafés, jardins, empresas e casas: não aparece nos mapas. Passei por lá há uns anos quando estava perdido a caminho de Valpaços, através da nacional. Lembro-me de ficar incrédulo por umas mulheres já estarem a lavar no tanque àquelas horas, do som da roupa encharcada a bater no cimento. Fora isso, um silêncio absoluto. Tivessem-me descrito o quadro e tê-las-ia imaginado em viva tagarelice ou a cantar. Era trabalho árduo, a hora imprópria até para madrugadores e a água estava fria, de repente parecia-me ridículo que tivesse podido imaginar alguém a cantar debaixo de tanta nitidez. Apenas uma delas olhou para mim dentro do carro vermelho, a meio de um gesto. Parei no Café Central para comer uma bifana, aviar um copo de vinho branco e pedir direções. Passei os olhos pela secção de necrologia do jornal, como se os mortos confirmassem a realidade, e acabei por me demorar mais porque começou a chover. Ainda vi passar um homem que gritou para dentro do café «Vais lá aparecer logo?», a quem responderam «Tu agora não queres mai' nada!». Já de saída fui encher a garrafa num bebedouro de granito com a inscrição «1872», que ficava à frente de uma capela, bem bonita aliás, de estilo medieval. Só quando finalmente cheguei ao meu destino me apercebi do insólito. Cheguei a procurar mapas em bibliotecas e lojas da especialidade, em nenhum encontrei sequer uma referência. Seria um nome antigo e a placa onde o vi assinalado resultante de uma comemoração histórica? Mesmo assim, não deixaria de ser inédito. Como pensar nela? Como uma cidade fantasma? Ou como uma cidade imaginária que realmente passou a existir?