17 de julho de 2014
16 de julho de 2014
15 de julho de 2014
11 de julho de 2014
Cortam árvores neste país como quem muda de cuecas. No meu bairro desapareceu mais uma, do pátio do Palácio do Machadinho, onde funciona o departamento cultural da câmara municipal de Lisboa. Era a última da rua do Quelhas no sentido de quem desce, não sei que árvore era, era uma daquelas que têm por vezes o tronco e os ramos cinzentos, era muito alta, ficava no meio de um pátio atualmente usado para estacionar carros. No dia anterior ao corte vi bloquearem os lugares de estacionamento da rua do Quelhas, suspeitei, fui perguntar. O segurança revelou o motivo, seria no dia seguinte às 8:00, a árvore ameaçava cair, já não se encontrava ninguém com quem pudesse falar sobre a responsabilidade disso. Hoje ergui os olhos para a ver, mergulhada nos meus pensamentos já não me lembrava disto, e vi o tronco cortado.
Nos passos que me restaram até casa percebi que o corte destas árvores, sem tumulto, sem que rios de dinheiro sejam gastos a salvá-las, sem comoção, é a medida da minha posição política no mundo.
10 de julho de 2014
Tento escrever sobre coisas muito elementares, que são talvez as mais complexas da vida. Quero perceber como é que essa complexidade se diz.
(...).
Tinha terminado um livro e queria começar qualquer coisa. Estava à espera. Passaram duas semanas, três e não acontecia nada. Então sentei-me numa sala de uma casa que tinha arrendado por ali e disse: «ok, aqui estou eu sem nada para fazer. É melhor ir à procura.» Escrevi umas 12 páginas sem saber o que estava a escrever. Queria apenas dar alguma utilidade ao meu tempo. Escrevi mais umas quantas e então o outro livro de que eu estava à espera chegou. Nessa altura pus aquilo de lado e não lhe voltei a pegar seriamente senão 20 anos depois. Parar e repegar é normal. Escrevi outros livros, fiz a minha vida. Eu estava à espera mas não estava inanimado.
(...).
[normal] É uma palavra que as personagens usam para tentar exercitar o domínio que têm sobre as suas vidas. Elas estão a viver um processo de saída dessa normalidade e a criar um vocabulário para isso. E dizem: «Eu estou bem, não sou assim tão diferente, não tenho de ser alvo de ajuda, e se tenho, bom... então talvez possa perder a minha vida. Ou talvez ainda tenha de arranjar uma vida para mim.» É quando se está desta forma tão emocionalmente isolado que nos afastamos do amor e da atenção das pessoas. Muito desse sentimento ou dessa sensação tem a ver com a palavra que escolhemos para nos descrevermos a nós mesmos.
(...).
As pessoas acham que passaram para lá da normalidade quando atingem os limites da imaginação. Muitas vezes chega-se a esse limite por coisas tão simples ou complexas como estar-se apaixonado ou doente ou numa situação moralmente constrangedora. Situações de vida em que a lucidez esteja em causa. Dostoievski escrevia sobre pessoas moralmente doentes. Há muitos livros sobre isso e sobre o modo como as pessoas sentem que têm domínio sobre essa normalidade. O curioso é que por vezes só se consegue sentir esse domínio quando se convoca a imaginação. As histórias tornam-se úteis para os leitores quando eles sentem que os livros e as personagens falam do mesmo que eles. Quando os limites da ficção os atingem como os seus próprios limites possíveis.
(...).
Sim. Talvez seja [o lado útil da literatura]. Não no sentido de resolver um problema. Útil no sentido em que se entra num livro como num território estranho e isso nos coloca num certo distanciamento em relação a algo que se vai revelando como nosso. E é esse distanciamento que permite um melhor entendimento do que somos.
(...).
Quando descrevo uma planície ou uma paisagem de montanhas é muito mais um exercício verbal do que de descrição. É escolher as palavras. Se eu quiser mudo a cor do céu.
Entrevista a Richard Ford, Público, 18.04.2014
Em vez de a contrariar, enquanto espreito a incógnita, decido colocar ainda mais lentidão nos meus passos, e reparo que aquele caminhar me conforta. Percebo, não sem algum tumulto, que aquele é um passo muito próprio, um tempo muito próprio: o meu próprio. Continuarei assim até ter descido a ladeira e chegado a casa. Passeio no jardim ao final da tarde, estou dentro da sombra das copas das árvores sobrepostas umas às outras, dentro dos seus profundos matizes de verde, de sombra e das cores das flores que mal acabaram de nascer já começaram a cair, das folhas largas que me lembram como sou pequena. Ao passar pelo portão algo se torna claro.
9 de julho de 2014
8 de julho de 2014
Se quisesse usar uma metáfora semelhante, teria de ser sobre como, quando regresso a casa, me vou afastando de camadas sucessivas de ruído e bulício, citadinos e íntimos, até finalmente me sentar e não haver mais nada senão uma página em branco à minha frente. Nos dias em que eu própria me torno a página em branco, cheguei a casa.