23 de abril de 2015

We are only lightly covered with buttoned cloth; and beneath these pavements are shells, bones and silence.

Virginia Woolf, The Waves.

21 de abril de 2015

Na minha rua ao meio-dia
um homem gordo
de fato cinzento e gravata
com óculos
sussurra a palavra
silêncio
inclinando ligeiramente a cabeça na minha direção
quando nos cruzamos
como se quisesse cumprimentar-me
ou ameaçar-me
embora não o conhecesse.
Isto aconteceu
e eu não tenho ninguém a quem possa contá-lo
porque ninguém senão tu
poderia
acreditar em mim
e tu não estás.
Ouviste bem?
perguntarias
desconfiado
e eu responder-te-ia que ele passou do meu lado bom
a escassos centímetros do meu ouvido
numa rua sem trânsito ao meio-dia
e que
por muito que repetisse mentalmente
a frase
estas coisas não acontecem
esta tinha acabado de me acontecer.
À tarde estive muito tempo sem saber o que fazer
sentada a olhar para as minhas mãos
até que me levantei e comecei a fazer muitas coisas
estando esta carta entre elas.
Estava no quiosque da rua das árvores
aquele
quando pensei
primeiro em escrever e depois em escrever-te
sobre isto
mas ao levantar-me não sabia como
e agora pelos vistos nem me interessa.
Pouco antes disso
quando cheguei
pedi um carioca ao balcão
e enquanto o tiravam da máquina
perguntei três vezes
quanto custava
e
sem resposta
possivelmente porque dentro do quiosque
o ruído era tal
que as vozes eram absorvidas
sobretudo a minha
desisti de repetir a pergunta
e esperei.
O rapaz poe a chávena à minha frente
e outro rapaz aparece à frente da chávena
a mexer na caixa registradora
pergunto
quanto custa
e o segundo rapaz olha para mim
mas fica muito espantado
como se estivesse a ver uma assombração
e não me diz o preço do café
não diz nada
só olha para mim
até que me rio
baixinho
a olhar nos grandes olhos dele
a olhar para mim
e enfim
antes que eu pudesse corar
eis que ele sorri de volta
como uma criança
inocente
e me oferece o café.
Talvez eu já não possa corar senão quando sonho
porque quando estava sentada
a beber o carioca
e a ler
um livro chamado
A Casa das Belas Adormecidas
de um japonês chamado
Yasunari Kawabata
pensei
meu deus
ainda bem que te riste!
só que já não era no rapaz que eu pensava
mas sim na minha vida
ou em como a vivi.
Na altura não percebi porque pensei aquilo
assim
e queria muito perceber
um daqueles pensamentos que não sabemos de onde vêm
que nos surpreendem por serem novos
mal acabados de nascer
e as coisas novas têm
o prazer intenso
do êxodo
que não se pode ignorar
e sobe-se um degrau
ou desce-se
isso não importa
o que importa é que nesse prazer
se perde a capacidade de corar
que envelhecemos
sentimos o vento na cara
uma voz
muito bem definida
como carvão novo
sobre papel virgem
ressoa no corpo
e sem nossa intenção
apesar de ser nossa
alastra
na terra no espaço na noite que rompe.
Então levantei-me
e a caminho de casa
pensando no que tinha para escrever
perguntei-me se esse pensamento
estaria relacionado com o livro
porque o livro fala de um velho
chamado Eguchi
cujas recordações são aparentemente arbitrárias
mas depois não são.
Senti-me desesperar por não saber de onde vinha
aquele pensamento
onde ouvi
com o estômago
todas as gargalhadas
verdadeiras
que dei na minha vida.
Só agora
que já me perdi dentro da escrita
posso dizer que talvez perceba
e sim
foi por culpa do livro
do velho Eguchi
que olhava para a pele branca das raparigas novas
e se recordava da filha que mais amava
ou de uma amante que nem tinha sido das mais importantes
porque o rapaz sorriu
e não conseguiu falar
enquanto olhava para mim.
Reparei entretanto
que estou a escrever sem vírgulas
que o horizonte
para lá da janela
ficou totalmente branco
e como é capaz de chover
apanhei a roupa.
Os corpos distinguem-se uns dos outros em razão do movimento e do repouso, da rapidez e da lentidão, e não em razão da substância.

Bento de Espinosa, Ética, Parte II, Proposição XIII, Lema I.

20 de abril de 2015

adormecer na dúvida irrazoável,
acordar na luminosa resposta.

19 de abril de 2015

Between two lifes,
throughout life,
during life,
an odd moment arrives
when you learn to part
from what you've seen before
because it no longer exists for you.
Because you need to forget.
The moment of parting
is a moment of death.
Parting comes like a winter night
in a scorching summer.
It undoubtedly
towers over
the gray banality
like a dead distant cousin,
or something like that.
Parting is unusual
it has a certain charm
and it has
a touch of pride.
Parting.

Nadav Lapid

17 de abril de 2015

Every man has reminiscences which he would not tell to every one, but only to his friends. He has other matters in his mind which he would not reveal even to his friends, but only to himself, and that in secret. But there are other things which a man is afraid to tell even to himself, and every decent man has a number of such things stored away in his mind. The more decent he is, the greater the number of such things in his mind. Anyway, I have only lately determined to remember some of my early adventures. Till now I have always avoided them, even with a certain uneasiness. Now, when I am not only recalling them, but have actually decided to write an account of them, I want to try the experiment whether one can, even with oneself, be perfectly open and not take fright at the whole truth. I will observe, in parenthesis, that Heine says that a true autobiography is almost an impossibility, and that man is bound to lie about himself. He considers that Rousseau certainly told lies about himself in his confessions, and even intentionally lied, out of vanity. I am convinced that Heine is right; I quite understand how sometimes one may, out of sheer vanity, attribute regular crimes to oneself, and indeed I can very well conceive that kind of vanity. But Heine judged of people who made their confessions to the public. I write only for myself, and I wish to declare once and for all that if I write as though I were addressing readers, that is simply because it is easier for me to write in that form. It is a form, an empty form—I shall never have readers. I have made this plain already…

Fyodor Dostoevsky, Notes from Underground.
ainda mal tinha acordado, saltou da cama, vestiu-se e precipitou-se escadas abaixo até à rua. enquanto dava os primeiros passos, reparava em como, no meio do atraso que o fez correr, surgia uma alegria forte, talvez por não ter pensado muito ou por estar a fazer uma coisa nova. a vida não devia ser sempre isto? a cada momento, boa ou má, uma coisa nova. um precipitar-se escadas abaixo para a rua. dois indianos passam de mão dada do seu lado direito, um limão pendurado na venda de morangos diante do portão da feira brilha, uma rapariga leva o garfo à boca dentro de um restaurante e, com a boca aberta, olha através do vidro, cruzando o seu olhar com o dele. está atrasado. uma pequena gota de suor, quase imperceptível, escorrega desde a têmpera pescoço abaixo, logo sendo tocada pelo vento. talvez o sedentarismo seja um erro contra a natureza. duas pretas cantam enquanto lavam a entrada de um prédio e um homem que passa entre elas com o jornal debaixo do braço não as ouve. não consegue discernir sobre se está intimamente em ordem ou desordenado, ambos os estados lhe parecendo igualmente justos. o sol alto caía. uma náusea breve e cortante sobressaltou-o e tornou o passo mais vagaroso, não podia dizer se muito se pouco. a crueldade da vida era afável.

16 de abril de 2015

numa fotografia onde, com menos de um ano, estou ao colo de um tio, vejo o meu olhar dirigido ao meu pai, que se encontra atrás da máquina fotográfica. não tenho memórias desse colo, desse dia, desse ano e creio que não gostaria de ter. mas sei que é ao meu pai que se dirige aquele olhar. o que leio nesse olhar é indistinguível entre o medo e a intuição, indistinguível entre a durabilidade e a velocidade. primeiro era o meu corpo, vulnerável e aberto, e depois o desconhecido, que nunca mais acabava de começar e terminar. porquê aquilo, que seguras nas mãos, e tão negro, entre ti e mim? porque ocultas o teu rosto? porquê esta distância, entre ti e mim? porquê aquilo em vez de mim? o meu crescimento não foi ainda capaz de se sobrepor a ti e à tua extinção. a tua extinção perdura, foi feita para perdurar, não apenas em mim mas na vibração da noite, mole, volumosa. não quero que aconteça nada, disse-te. enquanto durar a noite, só quero estar contigo. e que ela seja indissolúvel. disse-te.

15 de abril de 2015

Simplificando, nessa época [circa 1970], já me tinha distanciado de todos os movimentos políticos e das lutas pela liberdade. Acredito que alguém que queira mudar o mundo tem de começar não no que lhe é exterior, mas que o início dessa transformação é no seu interior. E essa é uma conquista que se alcança milímetro a milímetro.

Arvö Part

14 de abril de 2015

lembro-me da estranha sensação de partilha de intimidade quando vi uma exposição com companhia pela primeira vez. lembro-me de corar intensamente e baixar os olhos com um sorriso envergonhado diante de um quadro, reação que me fez pasmar dada a sua imprevisibilidade e inverosimilhança. nem os livros nem o cinema nem a televisão nem os amigos me haviam trazido notícia de tal possibilidade e contudo, a intensidade do meu pudor e o olhar de embaraço de quem me acompanhava, por sinal também ele virgem, davam-me a pensar que eu poderia não ser a única pessoa no mundo a conhecer a sensação. como se, diante de uma obra, não só nos despíssemos, mas tivesse lugar uma estimulação recíproca, de caráter secreto, privado, profundo, através da qual nos revelamos. Etty Hillesum diz que ainda é mais difícil falar de fé do que das coisas íntimas e, quando li isso, pensei que percebia perfeitamente o que ela queria dizer. mas não tinha na altura apercebido um espaço assim tão vasto para as coisas íntimas.

12 de abril de 2015

descobri que Freud se encontra dentro da categoria dos meus adversários prediletos. o exercício de me entregar às suas reflexões e de as refutar, senão uma por uma, pelo menos em grande maioria, é feito mediante uma conquista de paciência e de impassibilidade. acontece que por vezes concordo com ele. são esses os momentos que mais aprecio, pois o mundo abranda e eu com ele. quem não é paciente consigo próprio, não se aceita, e resta-lhe viver num mundo demasiado restrito. não tenho outro desejo senão o de permanecer no mundo onde me observo de forma impassível. como diz Santo Agostinho*, «cair e levantar-se é bom, mas nunca cair é ainda melhor».

*algures nas Confissões.

11 de abril de 2015

Escritor:
Isso está provado
Nós apenas temos provas para o fracasso
dos escritores
Todos os escritores falharam
Houve sempre apenas escritores falhados

Mãe:
E Shakespeare

Escritor:
Shakespeare também
mas eu disse todos
partem todos do princípio
de que falham
quando têm algum valor
Só os estúpidos os medíocres
nunca pensaram nisso
Pensar em falhar
é o pensamento essencial

Thomas Bernhard, No Alvo, 1990.
Há na intimidade um limiar sagrado,
encantamento e paixão não o podem transpor -
mesmo que no silêncio assustador se fundam
os lábios e o coração se rasgue de amor.

Onde a amizade nada pode nem os anos
da felicidade mais sublime e ardente,
onde a alma é livre, e se torna estranha
à vagarosa volúpia e seu langor lento.

Quem corre para o limiar é louco, e quem
o alcançar é ferido de aflição.
Agora compreendes porque já não bate
sob a tua mão em concha o meu coração.

Anna Akhmátova, Só o Sangue Cheira a Sangue, 1915.
e as histórias que não podem ser contos. porventura apenas um pormenor, cuja repercussão, contudo, atravessa uma vida. demonstrar essa repercussão, é como conectar um ponto do sonho com outro da vigília, sem nada deixar ao acaso no percurso entre ambos.

10 de abril de 2015

a tendência da criação contemporânea que radica no envolvimento com uma comunidade o objetivo em si da produção de uma obra de arte (as chamadas práticas artísticas comunitárias), soa-me sempre como os sinais de alarme emitidos por aqueles que temem o fim dos tempos e pretendem resgatar a fé à força, antes que chegue o derradeiro momento do Juízo Final. até determinado período, muito recente, a arte contemporânea dirigia-se e convocava apenas e somente o indivíduo. Freud terá sido um dos maiores responsáveis por esta passagem ao individual e ao seu caráter singular e, pelo menos desde os anos 60, tornou-se comum afirmar que há tantas leituras de uma obra de arte quanto forem os indivíduos que a observem (sendo o conceito de observação importante, por permitir abranger a noção de interação). ao dizer que cada um de nós é um artista, Joseph Beuys, levou ao limite essa afirmação, conferindo ao comum, de resto tal como John Cage, destaque individual, ou seja, caráter único, excecional. se antes a beleza era tida por raridade, apenas acessível e uma elite, num instante imprevisto e improvável, passou a estar disseminada numa multitude de acontecimentos que, embora eles próprios impermanentes, tornaram o seu acesso possível de modo permanente. a arte conceptual, em particular, veio contudo estabelecer uma diferença: a partir do momento em que a obra se pensa a si própria, passa novamente a pertencer a uma elite, detentora das suas chaves e códigos. mas sem deixar de se dirigir ao individual, pelo contrário, ainda através da exacerbação do potencial individual. desde a escolha dos materiais, à composição da forma, tudo na obra passou a constituir um código próprio inultrapassável. Susan Sontag chega a declarar que a arte tende para a anti-arte. que, tal como a atividade do místico se dirige à ausência de Deus e ao silêncio para além do discurso, também a arte tende para a eliminação da imagem ou do objeto, substituindo o acaso pela intenção. a inescapável mediação entre a criação individual, de dimensão espiritual, e o caráter material da arte, acaba por surgir ao artista como uma negação da transcendência que procura, nada lhe restando senão não criar.
se pensarmos que na Idade Média a ideia de um eu separado da comunidade nem sequer existia, e que, séculos mais tarde, mesmo um Louis XIV afirma que o Estado é ele, e não o contrário, percebemos que há casos em que nem a História ajuda, pois o que se perde fica perdido com o que se ganha — e uso aqui o verbo perder fora da sua conotação negativa, pois a perda é irremediável tanto quanto o ganho é passageiro. pelo menos desde a arte rupestre até ao período barroco, as obras de arte confundem-se, senão com a própria comunidade, através das suas vivências, pelo menos com a sua espiritualidade, através dos seus credos, espiritualidade que não era, pois a própria definição o impedia, vivida individualmente.
vivo num ciclo interminável de recomeços, lutos consecutivos, separada dos outros por uma rede inextricável de mal-entendidos. é engraçada a vida que me coube viver. antes procurava saídas. agora que posso admirar perfeitamente a rede (cuja espessura, grandeza e malha apertada me deixam espantada e incrédula por deixar passar o ar e portanto, por poder continuar a respirar), estou cada vez mais curiosa para perceber onde me levará a capacidade de a viver. do que posso ver acima de mim, pressuponho que seja uma rede cilíndrica mas, para ser completamente honesta, é uma abóbada, já que abaixo de mim nada vejo e nada toco, o que torna perfeitamente plausível a pergunta sobre a existência, que não é senão uma pergunta sobre limites. talvez um dia escreva qualquer coisa sobre isso. ou não. talvez, ao contrário, tudo o que procede do silêncio a ele regresse, e o percurso sirva apenas para adquirir uma forma mais plena, se é que isto seja coisa (não é) que se possa dizer sobre o silêncio. na verdade, sei que também esta malha é um engano. embora ainda não o possa ver, e porque ainda me lembro das suas formas anteriores, sei que um dia será porventura tão densa que acabará por desaparecer perante os meus olhos, transformando-se em pura escuridão intransponível, não sei se negra se branca. o que serei eu quando estiver a admirar isso não consigo imaginar. estou só curiosa por saber se ainda serei capaz de lhe dar um nome.

9 de abril de 2015

E la classe degli scialli neri di lana,
dei grembiuli neri da poche lire,
dei fazzoletti che avvolgono
le facce bianche delle sorelle,
la classe degli urli antichi,
delle attese cristiane,
dei silenzi fratelli del fango
e del grigiore dei giorni di pianto,
la classe che dà supremo valore
alle sue povere mille lire,
e, su questo, fonda una vita
appena capace di illuminare
la fatalità del morire.

Et la classe des châles noirs de laine,
des tabliers noirs à peu de lires,
des fichus qui enveloppent
les visages blancs des sœurs,
la classe des hurlements antiques,
des attentes chrétiennes,
des silences fraternels dans la boue
et de la grisaille des jours de pleur,
la classe qui donne valeur suprême
à ses pauvres mille lires,
et qui, là-dessus, fonde une vie
à peine capable d'illuminer
la fatalité du mourir. 


Pier Paolo Pasolini, poema sobre mulheres de mineiros vítimas de uma explosão de gás.

8 de abril de 2015

(...) la «rêverie» n'est pas démission, mais combat, fût-il d'ordre spirituel.

Raymond Trousson, Lettres françaises de Belgique: 1981-1990.
vejo-me a assumir vertiginosamente uma infantilidade plena. na medida em que sou cada vez mais perfeitamente pueril, inocente, ingénua e na medida também em que, por outro lado, desenvolvo — ou desenvolve-se, já que é um movimento amplamente involuntário —, um profundo desligamento do mundo. este movimento é em parte sentido como emancipação, serenidade, tranquilidade e, no mesmo peso, sentido como fragilidade, ameaça ou instabilidade.
que o sou — infantil — «cada vez mais perfeitamente», significa que o sou melhor. por exemplo: não se pode ser melhor uma coisa que se deixou de ser, porque isso implicaria voltar a ser o que já deixou de ser e portanto necessariamente, ser uma coisa nova. o tempo é o ónus da nossa humanidade, nada há que o inverta, belisque, reverta, pare. o amor pode confundir-nos com ele e esse é o limiar. ora, estou numa fase da vida em que não só afirmo que sou uma coisa que deixei de ser, como acrescento que o sou melhor e a seguir coloco um ponto final.
o que há de mais puro e subtil nos corpos não é atingível nem mesmo pela doença. é por isso que os corpos caem quando morrem, porque o devir é interrompido. o que a existência tem de perecível é isto portanto, o seu devir (e serão aliás muito poucas as situações em que um corpo está tão violentamente exposto ao devir como na doença), tudo o resto pode perdurar. todas as mortes são inconclusivas. o rigor que se espera da morte, nomeadamente nas expetativas de revelação que as pessoas alimentam sobre ela, não existe, porque o rigor é contrário àquilo que se termina, isto é, não existe rigor fora do movimento, não existe rigor onde não existe mudança e tudo o que a compõe, como volume, sensibilidade, ritmo. os fins são sempre remotos. ao contrário da existência, que é aquilo que é porquanto é, o fim é aquilo que nunca é enquanto não é.

5 de abril de 2015

Je parle des pierres qui n'ont même pas à attendre la mort et qui n'ont rien à faire que laisser glisser sur leur surface le sable, l'averse ou le ressac, la tempête, le temps.

Roger Caillois, L'écriture des pierres.